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03/08/20

Nutricionistas têm muitas possibilidades de atuação, diz profissional

Em entrevista, Maria Sylvia Carvalho conta que uma decisão tomada no Ensino Médio, que a obrigou a escolher um curso técnico em Nutrição e Dietética (TND), acabou decidindo por sua profissão.

Foto: Maria Sylvia / DivulgaçãoFoto: Maria Sylvia / Divulgação


Mais tarde, a escolha fortuita serevelou a mais que acertada.“Quando fui prestar vestibular, escolhi a Nutrição. Não me arrependi!”, garante ela. Maria Sylvia Carvalho de Barros é Nutricionista, tem Especialização em Saúde Pública e Mestrado e Doutorado em Alimentos e Nutrição. Durante 21 anos foi responsável pelo Restaurante Universitário   da   UFSCar e, atualmente, é professora universitária de várias disciplinas, dentre elas Controle de Qualidade e Legislação de Alimentos.

Leia a entrevista:

Por que você quis se tornar Nutricionista?

Fiz parte de uma geração que foi obrigada a fazer curso técnico quando estava no ensino médio. Uma das poucas opções que minha escola oferecia era o TND(Técnico  em  Nutrição  e  Dietética).  Tive  meu  primeiro  contato  com  a  Nutrição nesse momento. Depois, quando fui prestar vestibular, escolhi a nutrição porque me possibilitava juntar atividades assistenciais sociais (que foi o resultado de um teste vocacional que fiz)com a saúde. Não me arrependi!

Sempre quis trabalhar na área da educação? Como aconteceu sua inserção nesse setor?

Pode parecer incrível, mas nunca pensei nisso e não persegui esse objetivo. Saí da  faculdade  querendo  ir  para  o  mercado  de  trabalho  e  fuiatuar,  em  Belo Horizonte,com execução de políticas públicas (trabalhei na FAE –Fundação de Assistência  ao  Estudante  do  MEC,  que  antes  do  FNDE  era  quem  cuidava  da Alimentação Escolar no país). Fiz parte da equipe que avaliou a municipalização do PNAE, no final da décadade 1980. Nesse momento, senti falta de investir na minhaformação  e  fui  fazer  o  curso  de  Especialização  em  Saúde  Pública,  da Escola de Saúde de Minas Geraisem parceria com a Escola Nacional de Saúde Pública, da Fiocruz.Mais tarde, já de volta ao Estado de São Paulo e atuando no Restaurante Universitário da UFSCar, novamente senti falta de continuar a formação e fui fazer o Mestrado (e depois o Doutorado) em Alimentos e Nutrição, na Faculdade de Ciências Farmacêuticas daUNESP, em Araraquara. Quando terminei o Mestrado, fui convidada, por uma colega, para dar aulas em umCurso de Graduação  em Nutrição.  Aí  descobri  que  adorava  fazer  aquilo,  estar  em contato  com  os  alunos, preparar  e  dar  aulas. Me encontrei  na  sala  de  aula!Nunca mais parei.

Além  da  experiência  como  docente,  você  tem  sólida  experiência  como Nutricionista  responsável  pelo  Restaurante  da  UFSCar.  Conte-nos  sobre esse desafio.

Olha, foi mesmo um desafio. Saí da faculdade pretendendo nunca trabalhar em uma  UAN(Unidade  de  Alimentação  e  Nutrição).  Mas,no  início  da  década  de 1990, a instituição em que eu trabalhava estava para ser extinta e me transferi para a UFSCar, onde fui designada para o Restaurante Universitário. Em Minas Gerais eu já havia organizado e colocado para funcionar uma Unidade pequena, para atendimento de cerca de 80funcionários e alguns eventoscom, no máximo 200  pessoas.Cheguei  no  RU  da  UFSCar  eeram  servidas mais  de 2000 refeições por dia (ao longo do tempo que trabalhei lá, chegamos a quase 5000). Tudo era gigante! No início só pensava em comoe quando poderia ir para outro departamento! Mas a Universidade não tinha Curso de Nutrição, minha carreira era técnica e nãodocente e percebi que ia ficar no RU até me aposentar. Resolvi encarar a tarefa e tratei de recuperar o que aprendi na faculdade e de buscar mais informações, referências, cursos e o que fosse necessário para construir competência  na  área.  Fiquei  lá  por  21  anos, trabalhei  muito, acompanhei  e participei  do  crescimento,  ampliaçãoe otimização  dos  serviços  prestados,  da implantação de outros RUs nos demais campida UFSCar(Sorocaba e Lagoa do Sino), tive que encontrar soluções e buscar melhorias para problemas de compra de   alimentos   por   processos   de   licitação,   contratação   de   mão   de   obra terceirizada, informatização  do  sistema  de  acesso  aos  refeitórios, demandar, discutir e aprovar obras de reforma e ampliação de estrutura física, implantação de RU em campusnovo, instalado em fazenda localizada em regiãosem maiores recursos, entre outras coisas. Mas acho que construí competência para atuar na área  e  isso  contribuiu muito para  que  eume  tornasse uma  docente  com  mais experiência de vida profissional para poder transmitir aos meus alunos.

Quais as necessidades dos alunos de Nutrição atualmente?

Quando os alunos chegam à Graduação, sinto queé preciso desconstruir alguns “conhecimentos” que eles acham que têm (pela ampla divulgação, nem sempre confiável,  de  temas  relacionados à  alimentação e  nutrição  que  vemos hoje  na mídia  e  nas  redes  sociais),para  começar  a  falar  de  conteúdos  com  base  em evidências científicas. Aliás, acho que essa é a maior dificuldade que os próprios alunos  relatam:  a  de  encontrar,  compreender  e  saber  utilizar  esse  tipo  de conteúdo  na  prática  profissional.São  muitas  informações  desencontradas, truncadas,  com  caráter  de  divulgação  comercial.  E  da  forma  como  são divulgadas,  chegam  a  levar  alguns  alunos  a questionar  de  forma  incisiva  os docentes em sala de aula – dizendo que estão desatualizados. Também acho que  é  precisoque  a  gente  reforce  a  posição  de  que, de  modo  geral, com pacientes,clientes e com a população,precisamos falar mais de alimentação e bem  menos  de  nutrientes  e  suplementos (importantes para nossas  decisões técnicas,  masque  confundem  os leigos ao  tomarem  decisões  de  consumo). Acho  que  os nutricionistas precisam  ocupar  a  mídia  e  as  redes  sociaiscom conteúdo   sobre   alimentação   saudável   em   seus   diferentes   componentes (emocional,  afetivo,  cultural,  além  do  nutricional) e  sempre  com  base  em evidências  de  qualidade, para que  se  perceba  a  dimensão  da  área  e  as possibilidades de atuação profissional.

Estudantes  e  recém-formados  estão  cientes  das  múltiplas  formas  de atuação?

Com relação à atuação profissional, acho que seria importante os estudantes e os   profissionais   recém-formados   terem   mais   contato   com   histórias   de profissionais  de  sucesso  de  diferentes  áreas.  A  visão  que  muitos  têm  vem  da mídia  e  das  redes  sociais  e  eles  desconhecem profissionais  atuantes  e fundamentais  em  diferentes  segmentos  do  mercado  de  trabalho. Hoje  vemos alguns alunos que chegam ao Curso de Nutrição decididos a “atuar na área de esportes”, como eles dizem. Na verdade, percebo que para muitos, isso significa o desejo de atuar com emagrecimento e modificação da composição corporale não de colaborar, efetivamente,com a preparação de atletas. Alguns chegam e já são ou estão tentando se firmar como influenciadores digitais. Seguem perfis de celebridades (nutricionistas, médicos ou leigos) que postam conteúdo nessa área  e  consideram  que o sucesso  profissional  se  mede  pelo  número  de seguidores  na  internet. Quando  a  gente  fala  sobre  todas  as  possibilidades  de atuação profissional dos Nutricionistas, muitos se surpreendem. Poucos pensam na atuação na área clínica que extrapole a questão do emagrecimento, seja com relação  às  tantas  patologias  que  necessitam  de  alteração  dietética,seja  na promoção  de  alimentação  saudável. Falar  em  atuar  de  forma  não  prescritiva, então,parece  quecausa  um curto-circuito  na  mente  demuitos  deles. Quase nenhum  fala  em  atuar  em  Políticas  Públicas  na  área de  Alimentação  e Nutrição (A&N) ou de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN). Isso muda um pouco ao  longo  do  curso  e,  especialmente, durante  osestágios,  quando  descobrem que há muitas outras possibilidades. Entretanto, muitos enfrentam dilemas em relação ao mercado de trabalho, ao valor do piso salarial e às possibilidades de ganhos financeiros  suficientes  e  justos, atuando  de  maneira  ética e  com base em evidências. Fica a percepção de que os que se destacam(e ganham mais dinheiro),  na  verdade,  são  os  que  constantemente  ferem  o  Código  de  Ética  e Conduta.  Isso  é  muito  ruim  para  a  categoria  profissional.  Acho  que  é  preciso valorizar mais o profissional em suas diversas áreas de atuação, trabalhar pelo aumento do valor do piso salarial e divulgar as diferentes opções que o mercado de  trabalho  oferecee  contar  a  história  de  profissionais  de  sucesso,  para  que estudantes e profissionais enxerguem a carreira como realmente atrativa.

Recentemente, você participou delive promovida pelo SindiNutri-SP onde foi abordada a nova legislação sobre doação de alimentos. Qual o impacto dessalei sobre a atuação dos Nutricionistas?

Acho que o momento é propício para a gente refletir e debater mais a respeito de muitas questões importantes:  (a)  a  exclusão  social  que  enfrentamos  e  a existência  de  parcela  importante  da  população  em  situação de  Insegurança Alimentar e Nutricional, que não têm respeitado seu direito a uma alimentação adequada  e  saudável;  (b) a  importância  dasolidariedade,  fundamental  em tempos de crise, como o que estamos vivendo, mas que não pode se restringirà  distribuição  de  sobras  de  alimentos e  de  refeições;  (c)  a  necessidade  de redução do desperdício de alimentos em todas as etapas da cadeia produtiva e de  comercialização; e (d)aimportância  e  a  necessidade de  políticas  públicas soberanas  e efetivaspara  a  garantia  do  direito  constitucional  à  alimentação. Cabe  aos nutricionistas  refletirem  sobre  tudo  isso  e  sobre  seu  papel  nesse contexto. Lembrando que o que a nova legislação traz de novo é só a questão de se deixar de considerar as doações como relações de consumo e, portanto, eximir de responsabilidade criminal, conforme previsto no Código de Defesa do Consumidor, aqueleque doar alimento que cause algum dano a quem consumir, desde que não haja dolo.Isso é positivo porque muitos não doavam exatamente pelo  receio  de  que,  após  a  doação,  os  alimentos  e  preparaçõesdoadas  não fossem  transportadas,  conservadas  e  consumidas  de acordo  com  as  boas práticas, prejudicando a saúdedos assistidos. Acontece que toda a legislação sanitária não foi alterada e essa questão permanece, mesmo sem possibilidade de responsabilizaçãocriminal. Então, o nutricionista precisa se engajar nessas reflexões  e  discussões,  na  busca  de  soluções  práticas  e  seguras  para,  nesse momento  de  crise,  possibilitar  doações  solidárias  que  atendam  os  que  estão desamparados.Isso pode ocorrerno âmbito de sua própria atuação em UAN sou restaurantes comerciais, incorporando os controles e o acompanhamento das doaçõesàs  suas  rotinas,  mas  também  pode  ser  como assessor/consultorno âmbito de  associações  de comerciantes  e  empresários,  grupos  atuantes  na assistência social, conselhos municipais e outros que se disponham a coordenar e intermediar iniciativas de arrecadação e distribuição de alimentos e refeições. Mas  também  precisa  pensar  para  além  desse  momento  de  crise,  em  que  é preciso garantir a alimentação em caráter emergenciale passar a participar mais das instâncias que podem influenciar a discussão, a criação ea implementação de  políticas  públicas  que  foquem  na  redução  do  desperdício, no  consumo consciente, no  reforço  aos  circuitos  curtos  de  produção  e  comercialização  de
alimentos, nas  escolhas  por  alimentos  de  produção  sustentável  e  justa.É preciso, enfim, que o profissional esteja inserido na construção mais crítica de um padrão de atuação mais solidária e com responsabilidade técnica e social.

Qual  o  maior  desafio  para  oobjetivo  dessa  lei  se  concretizar,  ou  seja, aumentar a doação de alimentos em plena pandemia?

Acho que o maior desafio é criar e manter uma estrutura local (e não tem como não ser local)que favoreça a identificação de potenciais doadores de diferentes tipos de alimentos e, principalmente,de refeições, que é omais complicado. Issopela  própria  definição  sobre  o  momento  da  decisão  de  destinar as  refeições prontas à    doação,em que tipo  de embalagem, as condições de tempo/temperatura quedefinirãose  estão  próprias  ou  nãoaté  o  momento  do consumo, como recolher edestinarde formasegura. Não vejo como, individualmente,  UANseestabelecimentos  comerciais  poderão fazer  isso com segurança,sem o apoio e a intermediação de uma rede que cadastre doadores e receptores potenciais e que coordene as doações. A doação de alimentos in naturae processados já conta com o a experiência e a tecnologia desenvolvida por  Bancos  de  Alimentos  e  pelo  Programa  Mesa  Brasil,  cujos  profissionais podem contribuir bastante para a construção dessa nova rede.

Para o exercício profissional, é muito importante a atenção às normas elegislação vigentes. Os Nutricionistas têm papel ativo nessa regulamentação?

Acho que falta os próprios nutricionistas perceberem o quanto podem colaborar para essa construção. Os espaços de participação social, embora tenham sido reduzidos nos últimos anos, existem e precisam ser ocupados por nutricionistas.Conselhos e comissõespara definição de normas e ações em diferentes níveis de  governo,  consultas  públicas  realizadas  pelos  responsáveis  pela  legislação, como  por  exemplo  a  ANVISA  e  o  próprio  legislativo,  ações  para  pressionarvereadores, deputados e senadores quanto à importância de certas pautas e na defesa de determinadas posições. Tudo isso faz parte da atuação política cidadã. Muitos ainda enxergam esse tipo de atuação como “militância política” e rejeitam porque a percebem comopolítico-partidária (com todo o peso que isso tem num paíscomo o Brasil, hoje). Acho que temos, nos cursos de graduação e em todas as oportunidades, trabalhar a formação profissional cidadã. Um bom profissional tem que ser um bom cidadão –não só respeitar e agir de forma ética, mas cobrar e  contribuir  para uma sociedade  mais  ética,  solidária,  responsável,  inclusiva, sem   preconceitos. Seremos   mais   valorizados   quanto   mais percebermos, respeitarmos e colaborarmos com os espaços de representação e fiscalização profissional  (Sindicatos,  Conselhos  de Categoria, Associações),  quanto  mais espaços ocuparmos, quanto mais nos posicionarmos e atuarmos em defesa do que é importante para a saúde e a cidadania.

O nosso objetivo com essa entrevista é abordar a sua trajetória e também contribuir para a valorização da categoria. Caso tenha algo a dizer para que esse objetivo seja cumprido, fique à vontade.

Acho  que  precisamos  discutir  mais  e  divulgar  a  atuação  e  aimportância  do Sindicato,   assim   como   das   outras   entidades   da   categoria.   Vejo,   entre profissionais  e estudantes,  uma  confusão  muito  grande sobreo  papel  dos Sindicatos e dos Conselhos Regionais e uma percepção bastante limitadasobre as conquistas que já tivemos ou pelas quais ainda precisamos lutar.Enquantoa categoria  não  perceber  a  importância  da  participação  e  dessas  instâncias  de representaçãoe  fiscalização  do  exercício  da  profissão, acho  que vamos  ter dificuldades de avançar.


Fonte: ConversaNutri - SindiNutri





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