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15/10/13

O petróleo e o ouro do Brasil no tribunal da história

Ceci Juruá

Permitir que terceiros se apropriem do comando sobre o petróleo do Brasil, o ouro negro dos nossos tempos, como foi feito com o ouro branco das Minas Gerais, é uma traição à Pátria.

A descoberta do pré-sal na plataforma marítima brasileira representa mais uma oportunidade propícia à consecução de um grande salto econômico e social.  Na atualidade o petróleo é a riqueza capaz de garantir a construção de uma sociedade de bem-estar para todos os brasileiros.  Mas poderá ser oportunidade perdida, se não formos capazes de garantir o comando brasileiro de sua exploração.   Esta é uma lição da nossa história, retirada dos estudos realizados sobre os ciclos econômicos e, particularmente, o ciclo do ouro.

No Brasil o ouro foi descoberto na virada do século XVII para o XVIII. Representava a maior massa aurífera que aparecera desde o início dos tempos modernos, registra Roberto Simonsen no seu clássico “História Econômica do Brasil”.  É quase consensual, no entanto,  a convicção que o país mais beneficiado pela descoberta do ouro das Minas Gerais foi a Inglaterra, à qual Portugal se vinculava pelo Tratado de Methuen (1703).  Por isto reproduziu-se,  com o ouro, o processo que ocorrera com o açúcar, especiaria cujo cultivo entre nós beneficiara mais à Holanda do que a Portugal e ao Brasil.  A lição do açúcar brasileiro não fora aprendida pela metrópole Portugal. 

Entre 1701 e 1725, o volume de ouro brasileiro recebido anualmente em Londres passou de 1.785 quilos para 20 mil quilos, informa Pierre Villar em “Ouro e moeda na História”.  Segundo este autor, o ouro do Brasil drenado para a Inglaterra através do comércio (e do contrabando, dizem outros), facilitou enormemente o desenvolvimento inglês, pois permitiu àquela nação multiplicar por quatro a cunhagem anual de libras esterlinas em ouro. Sobrava, para a coroa de Portugal, um imposto de 20%, o quinto, mas apenas daquelas quantidades não contrabandeadas e levadas às casas de fundição instaladas no Brasil.

É inegável, diz-se hoje, que a expansão do mercado britânico naquele longínquo século XVIII, quando se iniciou a Revolução Industrial, recebeu forte impulso do ouro do Brasil. Com o nosso precioso metal foram cunhadas as libras-ouro e afinal, sabem os banqueiros, “só o ouro é dinheiro, o resto é crédito”.  Ratificando essa tese, quando analisou a economia mineira Celso Furtado destacou que as remessas do ouro brasileiro para Londres permitiram “substancial acumulação de reservas metálicas, sem as quais a Grã-Bretanha dificilmente poderia haver atravessado as guerras napoleônicas”. (Formação Econômica, p. 103)

Para os brasileiros, sobraram os efeitos indiretos. A imigração para o centro-sul e a ocupação dos sertões, a formação de capitais em tropas e escravos, a criação de um mercado de gado, tropas e produtos da agricultura de subsistência. Na cultura destacaram-se as igrejas e o Aleijadinho. Os 20% da tributação alimentaram, por outro lado,  o fausto de Portugal e sua corte.   

A seguir, os oitocentos foram tempos de café e de borracha, cuja  história é mais conhecida dos contemporâneos.  O traço central e grande avanço da época foi, na verdade, a emancipação política e a formação de um embrião de Estado nacional, que priorizou a consolidação da integridade territorial e o fomento da economia. Para tanto promoveu as estradas de ferro e a colonização.  

Retrospectivamente, constatamos que o século XIX foi também o século de formação do subdesenvolvimento.  Este não foi um processo autônomo, diz Celso Furtado, foi uma conseqüência dos impactos “irradiados do pequeno número de sociedades que se haviam inserido na revolução industrial em sua fase inicial...” Complementa afirmando que “as relações que se estabelecem entre esses dois tipos de sociedade envolvem formas de dependência que tendem a perpetuar-se” (Raízes do Subdesenvolvimento,  p.88).

Subdesenvolvimento e dependência explicam porque,  depois de tanto açúcar, ouro, café e borracha, o Brasil chegou ao século XX como uma grande fazenda. Sob a dominação de oligarquias atreladas aos interesses britânicos e norte-americanos, responsáveis por uma dívida externa impagável e por indicadores sociais da pior qualidade.  E com forte atraso relativo nas áreas fundamentais, estratégicas, para qualquer projeto de desenvolvimento: transportes e comunicações e energia.

Só a Revolução de 1930 permitiu alterar o que vinha sendo uma trajetória histórica de derrotas e oportunidades perdidas na economia, e deu novo rumo à história da nação brasileira. Nas grandes realizações da Era Vargas, inseriu-se o petróleo e a Petrobrás.  Mas também a siderurgia com as  Companhia Vale do Rio Doce e Companhia Siderúrgica Nacional.  Estas foram as bases materiais da industrialização brasileira no século XX.  O resto ficou por conta da criatividade, do empenho laborioso, da inteligência do homem brasileiro. Qualidades que permitiram ao Brasil os avanços tecnológicos e culturais que o capacitaram a se introduzir, sem atraso, nas novas tecnologias de comunicação do século XX, materializadas no computador e na informática. 

No entanto, a reversão neoliberal dos anos 1990 foi trágica, pois reintroduziu um período de modernização dependente, a exemplo do que ocorrera no século XIX. Ressurgiu assim uma  institucionalidade própria de país colonizado, submisso, periférico.  A entrega do petróleo brasileiro a empresas estrangeiras e aos trustes internacionais pode ser a consolidação da tragédia iniciada em 1990.  Permitir que terceiros se apropriem do comando sobre o petróleo do Brasil, o ouro negro dos nossos tempos, como foi feito com o ouro branco das Minas Gerais, é uma traição à Pátria e às aspirações históricas desse povo laborioso, criativo e inteligente. A história nos aconselha a dizer não aos leilões de petróleo.  Os campos do pré-sal devem servir ao Brasil e aos brasileiros.  


 "Ceci Juruá, economista, doutora em Políticas Públicas, membro do Conselho Consultivo da Confederação Nacional dos Trabalhadores Universitários de profissão regulamentada (blog www.desenvolvimentistas/caleidoscópiobrasileiro)



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